Gordofobia: o impacto da discriminação do peso na saúde e bem-estar
A gordofobia, ou o estigma social da obesidade, pode prejudicar a saúde da pessoa que sofre o preconceito. Na verdade, qualquer tipo de discriminação pode afetar o bem-estar mental e físico. A gordofobia é particularmente prejudicial porque ainda é permitida socialmente, podendo limitar as perspectivas de emprego, educação, ganhos e vida social de alguém.
Esta postagem analisa os efeitos na saúde da discriminação pelo peso, além de fornecer algumas orientações sobre como uma pessoa pode se defender caso esteja sendo alvo de preconceito por conta do seu peso.
O que é discriminação devido ao peso?
O estigma social da obesidade refere-se a um grupo de atitudes e julgamentos negativos sobre pessoas com obesidade e peso corporal mais alto. Alguns especialistas também incluem pessoas com distúrbios alimentares e peso corporal muito baixo.
A gordofobia é baseada em crenças distorcidas como estas:
- “As pessoas ganham peso porque não têm autodisciplina suficiente.”
- “As pessoas têm excesso de peso porque não trabalham duro ou são preguiçosas.”
- “As pessoas têm culpa se forem obesas.”
Na verdade, o ganho de peso muitas vezes pode ser o resultado de uma condição de saúde, como hipotireoidismo ou síndrome dos ovários policísticos. Alguns medicamentos também podem causar ganho de peso não intencional.
A discriminação devido ao peso é o que acontece quando alguém age com base em uma crença de que o peso da pessoa define sua personalidade. Em suma, é sobre tratar as pessoas de maneira diferente com base em seu peso corporal.
Como essa discriminação pode limitar oportunidades, é considerada uma questão de justiça social e também uma questão de saúde.
O quão comum é?
A gordofobia é generalizada. A mídia tradicional e as mídias sociais são os meios que mais sedimentam o preconceito, que pode ser encontrado em escolas, locais de trabalho e até em ambientes de saúde pelo mundo afora.
Enquanto muitos outros tipos de preconceito e discriminação estão melhorando lentamente, a gordofobia piorou, não melhorou, dizem pesquisadores.
Gordofobia no local de trabalho
Quando você é tratado de maneira diferente no trabalho por causa do seu peso, isso pode aparecer de muitas maneiras diferentes.
De acordo com uma pesquisa, as pessoas com obesidade são 37 vezes mais propensas a relatar discriminação no local de trabalho, enquanto pessoas com obesidade grave eram 100 vezes mais propensas a sofrer discriminação devido ao seu peso no trabalho.
São exemplos de gordofobia no local de trabalho:
- não ser contratado para determinados cargos
- receber mais avaliações de desempenho negativas
- receber comentários depreciativos
- ganhar menos dinheiro por fazer o mesmo trabalho ou semelhante aos outros
- não ser capaz de avançar no local de trabalho no mesmo ritmo que seus colegas
- ser penalizado por excesso de peso por meio de benefícios de saúde da empresa ou outros programas
Para muitas pessoas, essa discriminação significa que o trabalho não parece um espaço seguro. O ambiente pode parecer pouco favorável e até hostil.
A discriminação devido ao peso no local de trabalho é permitida por Lei?
De acordo com a pesquisa de 2020, apenas um estado dos Estados Unidos – Michigan – atualmente possui leis para proteger as pessoas contra a discriminação devido ao seu peso. Um punhado de cidades e vilas implementaram leis antidiscriminação para lidar com o problema, incluindo:
- Binghamton, Nova York
- Madison, Wisconsin
- Santa Cruz, Califórnia
- São Francisco, Califórnia
- Urbana, Illinois
- Washington DC.
Nota da CDD: No Brasil, a prática de gordofobia ainda não é crime, mas pode ser enquadrada por injúria e danos morais, que são da esfera criminal e cível, respectivamente.
Você pode encontrar mais informações sobre isso aqui, aqui e aqui.
Discriminação na saúde
Alguns profissionais de saúde foram treinados para considerar o peso como um sinal de saúde de maneira geral. As conversas sobre perda de peso são consideradas parte da rotina de cuidados.
Por mais bem-intencionadas que essas medidas tenham sido, o resultado é que algumas pessoas se sentem estigmatizadas nos ambientes de saúde.
Algumas diretrizes mais recentes recomendam uma perspectiva diferente. Uma pesquisa de 2017 publicada pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) recomenda enfatizar a atividade física para todas as pessoas, independentemente do índice de massa corporal (IMC).
Quais são as consequências da gordofobia?
É importante entender que o tratamento injusto com base no peso está associado a algumas consequências muito reais para a saúde.
- Você pode evitar ir ao médico, mesmo quando precisar de cuidados.
As pessoas às vezes sentem que seus médicos e profissionais de saúde as tratam injustamente por causa de seu peso.
De acordo com um estudo de 2021, as pessoas com excesso de peso sentiram que o estigma do peso afetou a rapidez e a eficácia com que foram tratadas e quanto apoio emocional receberam no sistema de saúde.
Se você acha que vai sofrer preconceito ou discriminação, pode acabar evitando ir ao médico, mesmo que realmente precise de cuidados. Dessa forma, o estigma do peso pode afetar seu acesso a cuidados de saúde de qualidade.
- Você pode não receber cuidados de qualidade quando for ao médico.
Você não está imaginando. Em alguns ambientes de saúde, os pacientes recebem cuidados inferiores quando têm obesidade. O profissional de saúde pode falar com você com menos empatia e gastar menos tempo explicando sobre as condições de saúde.
Em uma revisão de pesquisa que abrange 17 anos e 21 estudos diferentes, pessoas com obesidade disseram que foram tratadas com desprezo e desrespeito em instalações de saúde.
Os participantes do estudo relataram que seus médicos frequentemente atribuíam seu peso como sendo a causa de seus sintomas, não importando quais sintomas fossem estes.
Em alguns casos, esse desrespeito significava que as pessoas não recebiam um diagnóstico correto até muito mais tarde do que pessoas com peso considerado saudável.
Se você sentir que não está recebendo os cuidados de que precisa, procure outro profissional de saúde.
- Você pode desenvolver alguns mecanismos de enfrentamento insalubres.
Estudos mostraram que as pessoas que se sentem estigmatizadas por causa de seu peso tendem a comer mais para buscarem conforto como resultado.
A gordofobia também tem sido associada a uma maior compulsão alimentar e a comer mais alimentos por conveniência. Estes alimentos são geralmente processados e foram associados a um risco maior de desenvolver condições como:
- Câncer
- diabetes
- condições gastrointestinais
- depressão
- pressão alta
- doença cardíaca
- Você pode experimentar os efeitos nocivos do estresse a longo prazo.
O estresse é inevitável – e, de fato, um pouco de estresse aqui e ali pode realmente ser uma coisa boa. Mas o estresse que dura muito tempo é ruim para o corpo e para a mente.
Os pesquisadores descobriram que as pessoas que sofrem discriminação de peso têm o dobro do risco de 10 anos de alta carga alostática. Carga alostática é o termo médico para o acúmulo de efeitos negativos do estresse crônico.
Pessoas com altas cargas alostáticas têm maior risco de desenvolver muitos tipos de problemas de saúde, incluindo:
- doença cardíaca
- diabetes
- câncer de mama
- transtornos de humor
- doenças dos dentes e gengivas
- Você pode internalizar o preconceito.
Ideias negativas sobre o peso podem se infiltrar no autoconceito ao longo do tempo. Os pesquisadores se referem a esse problema como gordofobia internalizada.
Estudos mostram que cerca de 40% de pessoas com sobrepeso e obesidade internalizaram o preconceito, desvalorizando-se como resultado.
Vários estudos vincularam este autoconceito a problemas de saúde mental, como:
- depressão
- ansiedade
- baixa auto-estima
- uma imagem corporal negativa
- Você pode se exercitar menos.
Um estudo de 2017 envolvendo cerca de 5.500 participantes descobriu que as pessoas que sofreram discriminação baseada no peso tinham cerca de 30% menos probabilidade de se envolver em uma atividade física robusta uma vez por semana, independentemente do IMC real.
Outros estudos mostraram que o estigma do peso está associado a evitar a academia e exercícios em grupo.
Algumas pessoas desenvolvem estratégias de enfrentamento que permitem que elas se exercitem sem estar em ambientes de grupo onde eventos traumáticos estigmatizantes tenham acontecido com elas. Por exemplo, exercitar-se em casa pode ser um ambiente mais seguro, onde há menos risco de ser alvo de discriminação.
Essas estratégias são importantes, pois o exercício pode levar a uma ampla gama de benefícios à saúde.
- Veja aqui dicas para começar a caminhar.
- Você pode ter um risco aumentado de uma expectativa de vida mais baixa.
O quão prejudiciais são os efeitos a longo prazo da gordofobia?
Pesquisadores em um estudo de 2015 descobriram que viver com o estigma baseado no peso pode ser mais prejudicial do que a obesidade.
Os pesquisadores descobriram que as pessoas que sofreram discriminação cotidiana com base em seu peso tinham um risco 60% maior de morte no período estudado.
Esse risco foi independente de outros fatores, como o IMC de uma pessoa ou o uso de tabaco.
O que você pode fazer?
Se você está sofrendo discriminação relacionada ao seu peso, a primeira coisa a reconhecer é que não é sua culpa. Como acontece com outras formas de discriminação, o problema está com aqueles que tratam os outros injustamente – pessoas que:
- intimidam outras pessoas nas escolas e nas mídias sociais
- criam ambientes de trabalho hostis
- envergonham e estigmatizam, mesmo em ambientes de saúde
Especialistas dizem que uma mudança social de cima para baixo é necessária.
Quer você decida ou não participar dessa mudança social, há passos que você pode tomar para identificar e mudar os preconceitos que podem ter se infiltrado em seu autoconceito ao longo do tempo.
Um estudo de 2019 explorou o preconceito internalizado e as pessoas que sofreram discriminação de peso acharam úteis as seguintes estratégias:
- Crie uma contra-história. Você pode reparar ou substituir a história que conta a si mesmo sobre peso e discriminação. Algumas culturas transmitem “narrativas mestras” sobre pessoas com obesidade. Uma dessas narrativas é que as pessoas com obesidade não fazem atividade física suficiente. Alguém com uma condição crônica de saúde pode substituir essa narrativa falsa, concentrando-se em sua jornada de saúde. As pessoas que reescreveram histórias sobre o próprio peso dizem que isso as ajudou a “restaurar sua identidade” e “reestruturar suas vidas para criar um eu mais saudável”.
- Procure um lugar de apoio para compartilhar sua história. Alguns participantes do estudo puderam trocar histórias e compartilhar fotos e outros objetos ligados a memórias. Compartilhar permitiu que as pessoas encontrassem significado em suas experiências e aprendessem com o que os outros haviam passado. Procure grupos de apoio, pessoalmente ou online, onde você possa compartilhar suas experiências com outras pessoas que tiveram experiências semelhantes.
- Reconhecer e resistir a mensagens estigmatizantes. Os estereótipos da mídia e as mensagens de saúde pública em torno do peso geralmente contêm preconceito. Mensagens que envergonham ou culpam não são saudáveis. Você pode aprender a reconhecer, identificar e resistir a essas mensagens. Você pode reformular mensagens prejudiciais de maneiras mais gentis e verdadeiras. Você pode considerar conversar com um terapeuta que tenha experiência em ajudar pessoas que têm obesidade.
A gordofobia é prejudicial. Quando você é tratado de forma diferente por causa do seu peso, isso pode aumentar seu nível de estresse e levar a problemas de saúde a longo prazo. Você também pode internalizar crenças negativas relacionadas ao peso de maneiras que acabam prejudicando sua saúde mental e física.
Para proteger seu bem-estar, é importante aprender a reconhecer mensagens não saudáveis sobre seu peso – sejam elas vindas de dentro ou do mundo ao seu redor. Você pode ajudar a criar uma narrativa mais gentil que apoie sua saúde.
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Tradução e adaptação: Equipe da Crônicos do Dia a Dia (CDD)
Fonte: Healthline
Escrito por Rebecca Joy Stanborough, MFA, revisado por Jason Daniel-Ulloa, PhD, MPH, em 28 de janeiro de 2022.