“Mamã, não coce, foram as primeiras palavras da minha filha”
Hoje trazemos o depoimento que Joana Camilo, Presidenta da Associação de Dermatita Atópica de Portugal, parceira da CDD como membro da GlobalSkin, deu ao jornal Expresso.
“A dermatite atópica acaba por ter impacto na minha vida, porque eu sei que só o ato ou o barulho do coçar já causa stress naqueles que me rodeiam. Tem um impacto grande, quando lembro que as primeiras palavras da minha bebê de 28 meses foram: ‘mamã, não coce’. Viver com esta doença é… pesado.”
É desta forma, emocionada, que Joana define a dermatite atópica, que, no seu caso, atravessa três gerações: “A minha mãe sofre da doença e para ela foi um grande choque quando soube que eu também tinha. Ter um filho que apresenta os primeiros sinais na mesma idade que eu tinha quando me foi diagnosticada, é preocupante”.
Joana tem 40 anos. Engenheira bióloga e coordenadora de um gabinete ligado à investigação e inovação em saúde, na Universidade Católica, sofre da doença desde os sete anos. “Tem uma carga do ponto de vista físico e psicológico muito pesada, porque é muito inconstante: ora estamos relativamente bem e daí a umas horas podemos estar mal. É muito desgastante, sobretudo porque não podemos controlar os sintomas: uma comichão permanente, como aquela picada de mosquito, aquela baba que sentimos com muita comichão; é multiplicá-la por vários pontos do corpo, ter babas do tamanho de mãos e sofrer por isso. E não é só essa comichão, mas a dor que fica”.
Por norma, as noites são mais difíceis. Acorda duas, três vezes para se controlar, mas o despertar não é mais simples: “Começa de uma forma mais custosa. Depois da noite, não sabemos como foram os estragos da comichão. É uma altura em que tomo o duche e é complicado, porque sentimos golpezinhos quando a água entra em contato com a pele e quando saímos do banho parece que passámos uma lixa”.
Além do mal-estar físico, a doença obriga a certos cuidados a nível doméstico. “Tenho de mudar quase diariamente os lençóis da cama ou a roupa de dormir, porque ficam manchados com o sangue e com um líquido que a pele segrega. Tenho de varrer ou aspirar constantemente a casa, porque eu vejo a minha pele no chão da cozinha e eu quero proporcionar o melhor ambiente para os meus filhos”.
Durante muito tempo, tentou relativizar ou até silenciar a dermatite atópica… “uma doença que acaba por nos pôr em causa. Às vezes até nos faz sentir que somos menos fortes, por não termos capacidade de controlar algo que devíamos conseguir controlar. Eu não devia ter de mascarar, mas ajuda-me um bocadinho a diminuir o peso que a doença tem. Agora não devia ser necessário. Em várias ocasiões sinto necessidade de dizer o que é que tenho, porque as pessoas desconfiam daquilo que não sabem e tudo isso complica”.
E é para descomplicar os contornos desta doença, que Joana expos o seu caso. “Apesar de tudo, eu tenho esperança. Felizmente que a dermatite atópica está a começar a ter a atenção que precisa, nomeadamente do ponto de vista de investigação e esperemos também do ponto de vista de acesso a cuidados no tratamento”.
Texto originalmente publicado em https://expresso.pt/sociedade/2019-03-01-Mama-nao-coce-foram-as-primeiras-palavras-da-minha-filha