14.12.2022 Saúde Pública

SUS em debate: O que está em jogo na 17º conferência nacional de saúde

Após enfrentar uma pandemia e duros cortes no orçamento da saúde, o Brasil terá em 2023 a 17ª Conferência Nacional de Saúde. Realizado pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) e o Ministério da Saúde a cada quatro anos, o evento de 2023 será entre os dias 2 e 5 de julho, em Brasília. As etapas municipais de discussão começaram em novembro, e  buscam opções para melhorar o atendimento no SUS. 

“O que for aprovado na conferência vai ser a base para a construção do próximo Plano Nacional de Saúde (PNS). É um momento crucial para pautar demandas no planejamento da gestão dos próximos quatro anos”, afirma a psicóloga Vitória Bernardes, que representa as ONGs Amigos Múltiplos pela Esclerose (AME) e Crônicos do Dia a Dia (CDD) no CNS. 

AME e CDD estão na comissão organizadora da 17ª edição. “Movimentos de pessoas que convivem com condições crônicas se organizam para defender as suas propostas”, afirma Bernardes. 

As pautas em debate

Uma das reflexões mais relevantes da nova edição será o enfrentamento dos problemas deixados pela pandemia. “A nova realidade é a síndrome pós-covid. Será preciso estruturar um processo de acolhimento desses pacientes, que ainda não foi desenvolvido pelo governo”, afirma.  

Bernardes também enfatiza a importância de pensar em uma estrutura que prepare o país para as próximas pandemias, que devem se tornar cada vez mais comuns devido às mudanças climáticas e ao avanço do desmatamento. “Vamos precisar entender o impacto da desorganização do estado brasileiro. O Plano Nacional de Imunização, por exemplo, era referência, mas foi desarticulado durante a pandemia de covid-19”, destaca a conselheira. 

Caberá também aos participantes da conferência entender o quanto a dependência do mercado externo afetou os pacientes infectados pela covid. “Na pandemia, faltou medicamento para fazer entubação porque não havia um planejamento interno para compra, e o Brasil não está produzindo insumos. Precisamos discutir tudo o que vivenciamos”, diz.

O represamento de cirurgias e consultas eletivas causado pelo contingenciamento de recursos para a covid é outro desafio, somado à insegurança alimentar, com a volta do Brasil ao mapa da fome. 

Todas essas questões precisarão ser discutidas levando em conta um orçamento reduzido. A proposta de orçamento de 2023 para a saúde ficou em R$ 149,9 bilhões, o menor valor desde 2019. O programa Farmácia Popular, por exemplo, teve um corte de 50%.

CNS deu origem ao SUS

A primeira conferência aconteceu em 1941, antes mesmo da criação do Ministério da Saúde, mas não reunia a sociedade civil. Foi somente a partir da 8ª edição, em 1986, que as reuniões passaram a ser abertas à participação popular. Foi nesse encontro histórico que se introduziu a discussão sobre a inclusão, dois anos mais tarde, da saúde como um direito constitucional. “A criação do SUS, na Constituição de 1988, já previa que o sistema iria depender da participação social”, conta Bernardes. 

A última Conferência Nacional de Saúde, em 2019, reuniu 5 mil pessoas de todo o país, com o número de representantes proporcional à população de cada estado. Uma das propostas, por exemplo, foi o fortalecimento do sistema de saúde indígena. O PNS 2020-2023 estabeleceu metas concretas, como alcançar 50% das gestantes indígenas com, no mínimo, seis consultas de pré-natal.

Atualmente a participação nas conferências funciona como um funil: na esfera dos municípios, o espaço é livre para quem quiser pautar demandas: basta procurar o Conselho Municipal de Saúde da sua cidade. Das reuniões municipais, saem pautas para as conferências estaduais, com vagas limitadas: delegados são eleitos para representar as demandas que não puderam ser incorporadas ao nível municipal. 

Depois dessa etapa, as propostas e seus representantes se afunilam mais ainda para a tão aguardada Conferência Nacional de Saúde, de onde sairá um relatório final com as demandas a serem incorporadas ao SUS no plano de gestão executado pelo governo federal. Esse plano é válido por quatro anos, até a próxima conferência, abrangendo o primeiro ano do governo subsequente para haver uma transição mais suave de uma gestão à outra.

Neste ano, foi a primeira vez que o Conselho abriu a possibilidade de as chamadas conferências livres elegerem delegados e terem propostas incorporadas no relatório final da etapa nacional. Essas conferências são promovidas pela sociedade civil e podem acontecer no formato presencial, online ou híbrido, da esfera municipal à nacional. As reuniões não precisam seguir formalidades como um número mínimo de participantes, representatividade por segmentos ou eleição de delegação para a etapa principal.

O papel das ONGS
A participação das organizações não-governamentais no Conselho Nacional de Saúde depende da abrangência da sua atuação. “É preciso que essas organizações sigam critérios, como atuar em pelo menos nove estados de três regiões distintas”, explica Bernardes. 

Enquanto o Conselho é composto por entidades, as conferências de saúde contam com a participação de representantes da população brasileira, eleitos nas etapas municipal e estadual. Metade dos delegados são usuários do SUS, 25% trabalhadores da saúde pública e 25% gestores das prestadoras de serviço para o SUS. Gênero, raça, sexualidade e deficiência são usados como fatores para um eventual desempate. Todos os membros do CNS são delegados nas conferências nacionais. Bernardes, por exemplo, representa a AME e a CDD no Conselho, mas participa como pessoa física nas conferências. 

Quem tiver interesse em participar e saber mais sobre o maior encontro deliberativo da saúde brasileira pode entrar em contato com Vitória Bernardes pelo e-mail vitoria@amigosmultiplos.org.br.

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